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Riqueza e ruína: a decadência do império de Sean Combs

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Nova York – Os promotores argumentaram que Sean Combs deveria ficar preso até seu julgamento por acusações federais de organização criminosa e tráfico sexual, retratando-o como um magnata da música extremamente rico e bem relacionado que estaria em uma posição favorável para fugir. Nos documentos judiciais, foram citadas reportagens que estimavam sua fortuna em cerca de US$ 1 bilhão.

Mas, à medida que sua reputação foi desmoronando em meio a uma onda de processos judiciais e acusações criminais de alto nível, seu portfólio de negócios também se desfez. Combs, antes um importante embaixador de marca e presidente de uma plataforma de mídia, foi forçado a se afastar desses papéis. Em junho, meses antes de ser indiciado, a Forbes estimou seu patrimônio líquido em US$ 400 milhões, em comparação com US$ 740 milhões em 2019.

A fortuna de Combs está no centro de sua imagem pública desde os anos 1990, quando o sucesso de sua gravadora de hip-hop e R&B, Bad Boy Entertainment, tornou-o conhecido por seu estilo de vida extravagante e luxuoso e pela música que produzia.

Há um ano, Combs, também conhecido como Diddy, estava à frente de um portfólio em constante expansão: fundador de uma gravadora, promotor de bebidas alcoólicas, presidente de um canal de TV a cabo e mídia digital, filantropo e executivo de moda com uma marca chamada Sean John. “Ele era um marqueteiro de primeira linha. Costumava dizer que era o mestre de cerimônias de um circo”, afirmou Dessie Brown Jr., consultor de entretenimento que sempre viu Combs como um modelo para construir uma carreira.

Mas as tendas do circo começaram a desabar, uma a uma, durante uma avalanche de processos por abuso sexual que começou em novembro. Combs, que negou ter abusado de qualquer pessoa, concordou em encerrar a parceria lucrativa com a Diageo, gigante de bebidas, em meio a uma disputa judicial, e vendeu sua participação na Revolt, empresa de mídia que fundou. O valor de seu catálogo musical – que inclui participações em sucessos como I’ll Be Missing You e It’s All About the Benjamins – foi ameaçado pela derrocada de sua reputação. Seus representantes se recusaram a fazer comentários sobre suas finanças.

Os advogados de Combs, que se declarou inocente das acusações de organização criminosa e de tráfico sexual, apelaram da decisão judicial de mantê-lo preso até o julgamento. Garantem que seu cliente não apresenta risco de fuga, uma vez que viajou voluntariamente a Nova York para se entregar. Consideram o volume grande de processos – que agora ultrapassa 20 – uma tentativa de obter acordos financeiros de uma figura pública rica.

O patrimônio líquido de celebridades é objeto de constante especulação, mas pode ser difícil calcular com precisão a fortuna total de uma pessoa a distância, sobretudo no caso de alguém como Combs, cujo portfólio é amplamente privado e está sujeito a mudanças em razão de seus problemas legais. “É como tentar pegar uma faca caindo. Acredito firmemente que ele já foi bilionário em algum momento. Mas tenho igual certeza de que já não é”, disse Zack O’Malley Greenburg, jornalista e ex-editor da Forbes, que estudou as finanças de Combs em 2022.

‘Marcas negras’

Boa parte da riqueza de Combs vem de seu trabalho com a Diageo, que teve início há mais de 15 anos, quando passou a representar a marca de vodka Ciroc. A parceria comprou a DeLeón em um acordo de investimento conjunto, há cerca de uma década, e Combs usou sua fama para promover a tequila nas redes sociais, em entrevistas e como destaque em videoclipes. Um executivo da Diageo escreveu em uma declaração judicial no ano passado que a empresa pagou a ele quase US$ 1 bilhão no decorrer da parceria.

Mas o conflito veio a público em 2023, quando a empresa de bebidas de Combs processou a Diageo, acusando-a de classificar a Ciroc e a DeLeón como “marcas negras” que deveriam ser voltadas só para clientes “urbanos”. A Diageo negou as acusações de racismo e acusou Combs de má gestão.

A disputa legal ainda estava em andamento quando a cantora Cassie entrou com um processo explosivo, acusando Combs – seu ex-namorado e chefe da gravadora com a qual tinha contrato – de ter abusado dela, física e sexualmente, durante anos. Ele rapidamente chegou a um acordo com Cassie, cujo nome completo é Casandra Ventura, mas outros processos vieram na sequência.

Parte da disputa de Combs com a empresa de bebidas envolvia seu direito de continuar representando a DeLeón. Depois do início da onda de processos judiciais, os advogados da Diageo argumentaram que era “impossível que Combs continuasse sendo o ‘rosto’ de qualquer coisa”. Em janeiro, ele e a Diageo resolveram suas disputas, os processos foram retirados e o rapper vendeu sua metade da DeLeón. Um relatório público para investidores revelou que a venda foi de aproximadamente US$ 200 milhões.

Um catálogo ameaçado

A fortuna de Combs teve origem em sua ascensão como um produtor musical na casa dos 20 anos cujo trabalho ajudou a tornar o hip-hop um movimento pop global. Começou como estagiário não remunerado, fazendo trabalho de campo para o fundador da Uptown Records, Andre Harrell, antes de ser promovido a um cargo executivo no início dos anos 1990.

Depois de uma batalha de egos na gravadora, Harrell demitiu Combs, em 1993, permitindo que este levasse um talento da Uptown – Notorious B.I.G. – para sua empresa, a Bad Boy, que fechou um acordo de distribuição com a Arista, gravadora grande liderada por Clive Davis. “Eu o demiti e basicamente o tornei rico”, disse Harrell no documentário produzido por Combs sobre a história da Bad Boy.

Durante anos, a Bad Boy foi a casa de alguns dos artistas mais populares do hip-hop, como Mase, Craig Mack, Black Rob e Faith Evans, e o próprio Combs estreou na gravadora como Puff Daddy. Depois do seu auge cultural, a Bad Boy continuou a desenvolver talentos e lançar estrelas – Machine Gun Kelly, Janelle Monáe e French Montana foram contratados por ela em algum momento –, mas, no decorrer dos anos, passou de uma gravadora ativa com um estúdio de gravação icônico para uma marca de legado, cujo valor reside em seu catálogo.

A empresa acabou saindo de seu escritório em Manhattan, que um dia foi sua sede. O edifício foi demolido este ano para dar lugar a um hotel de grande porte. Segundo Tony Drootin, ex-gerente do estúdio de gravação da Bad Boy, em Midtown Manhattan, conhecido como Daddy’s House, em 2014 houve um ponto de virada na cultura da gravadora, quando Combs decidiu fechar o estúdio. Na época, o streaming estava abalando a indústria musical, contou Drootin, e os preços dos imóveis estavam disparando: “Não fazia sentido do ponto de vista financeiro, porque ele podia fazer muito do que precisava na sala de sua casa com um computador e um microfone.”

Apesar da longa história de hits de Combs, seu catálogo musical agora parece gerar apenas receitas modestas, em parte porque já não detém os direitos de seus álbuns mais populares. A revista especializada Billboard recentemente estimou que Combs atualmente faz cerca de US$ 1,25 milhão por ano com suas gravações e seus direitos de publicação musical. Se ele decidisse vender esse catálogo, seu valor provavelmente seria reduzido pela publicidade negativa em torno dos problemas legais, segundo quatro profissionais que se dedicam a comprar e avaliar catálogos musicais.

Merck Mercuriadis, que fundou a empresa de investimentos musicais Hipgnosis, comparou o catálogo de Combs com o de R. Kelly, que tem números de streaming consistentes, mas não encontrou nenhum comprador: “Ninguém vai comprar esses catálogos. Com esse tipo de polêmica envolvida, ninguém vai arriscar um investimento institucional.”

No começo de 2023, todos os interesses empresariais de Combs foram renomeados sob um título novo: Combs Global, com a visão de construir o “maior portfólio de marcas líderes de propriedade negra do mundo”. Mas, em comparação com os dias movimentados nos escritórios da Bad Boy, em Manhattan, o trabalho cotidiano na Combs Global foi relativamente descentralizado. A maioria dos funcionários trabalhava remotamente e, quando os executivos faziam uma reunião presencial, muitas vezes era na ilha de Miami Beach, onde Combs vivia, relatou um ex-executivo que se afastou da empresa em meio aos processos contra o magnata.

A Combs Global se tornou o centro de marcas como a Love Records, gravadora de R&B que fechou um acordo breve com a Motown para o álbum de retorno de Combs, em 2023 – que, no fim, foi lançado de forma independente, sem a participação da Motown –, e a Sean John, marca de vestuário que Combs comprou de volta por US$ 7,6 milhões depois da falência de seu principal proprietário. Atualmente, a linha de roupas está em grande parte indisponível para venda.

A Combs Global também supervisionava seu trabalho beneficente e com uma missão específica, incluindo seu mercado on-line para as empresas negras e uma parceria com uma rede de escolas subsidiadas de Nova York que ele ajudou a expandir. “Sim, tenho a bênção de ser bilionário. Mas, ao mesmo tempo, se minha comunidade não estiver bem, não posso me sentir confortável”, declarou no ano passado em entrevista no Invest Fest, evento anual dedicado ao fortalecimento financeiro da população negra.

Depois da abertura dos primeiros processos por abuso sexual, houve uma saída em massa de sua empresa, porque muitos funcionários – incluindo altos executivos – decidiram que não queriam continuar associados à marca. Também houve ondas de demissões à medida que os interesses empresariais do magnata desabavam.

Combs resolveu o processo de Ventura com um acordo que, segundo seus advogados, alcançou um valor de oito dígitos. Mas, com a pilha de processos aumentando, o portfólio de marcas e causas de Combs desmoronou gradativamente. Vendeu sua participação na Revolt, empresa de mídia que fundou há mais de uma década, por uma quantia não revelada. A rede de escolas subsidiadas por ele encerrou a parceria. O Empower Global, seu mercado on-line, atualmente está desativado.

O fim do estilo de vida luxuoso

Enquanto aguarda julgamento em uma unidade especial do Centro de Detenção Metropolitano, no Brooklyn, Combs enfrenta um estilo de vida muito distante de seu jato particular e de casas luxuosas, carros e obras de arte. Sua mansão de dez quartos no bairro de Holmby Hills, em Los Angeles, que foi revistada como parte da investigação criminal, está à venda por US$ 61,5 milhões.

Sua casa em Miami Beach, na Flórida, foi avaliada em US$ 48,5 milhões. Os advogados de Combs esperavam usá-la como garantia para uma proposta de fiança de US$ 50 milhões, mas o tribunal rejeitou a oferta no mês passado. (Combs pagou US$ 18 milhões de hipoteca para assegurar que a casa pudesse ser usada como parte do possível pacote de fiança.)

Embora a situação financeira do rapper pareça estar em declínio, o governo destacou repetidamente que ele ainda é um homem muito rico, alguém cuja fortuna, segundo os investigadores, aumenta o risco potencial de fuga caso seja libertado sob fiança. O governo informou que, no fim do ano passado, Combs possuía mais de US$ 1 milhão em dinheiro “à mão”, além de dezenas de contas bancárias pessoais e corporativas contendo milhões de dólares e veículos em vários locais.

Os promotores disseram que a riqueza de Combs lhe permitiu empregar uma rede de associados que o ajudaram a facilitar o tráfico sexual e a encobrir seus crimes. Esses esforços, segundo o governo, incluíram tentativas de obter imagens de segurança de hotéis para ajudar a esconder uma agressão brutal a Ventura em 2016. “A narrativa que ele construiu em torno de sua riqueza agora representa um problema para sua defesa e se tornou uma munição para a acusação”, observou Zakiya Larry, especialista em relações públicas e comunicação de crises.

Mas sua fortuna também respalda um grande conjunto de advogados de defesa liderado por Marc Agnifilo, que já representou réus de grande notoriedade, como Keith Raniere e Martin Shkreli. Eles estão tentando garantir sua libertação prometendo instalar uma equipe ampla e cara de segurança privada para vigiá-lo constantemente enquanto permanece em sua casa em Miami Beach. A equipe, que os advogados propõem que seja liderada por um ex-detetive da polícia que já trabalhou nos serviços de segurança do presidente George W. Bush e do vice-presidente Al Gore, foi projetada para refutar o argumento do governo de que, além de fugir, Combs usaria sua liberdade para intimidar possíveis testemunhas. “Ainda que o tribunal não dê credibilidade a ele, que confie no pacote como um todo”, disse Agnifilo ao tribunal no mês passado. Mas os promotores se opuseram à proposta da defesa. Ao argumentar contra ela, em uma petição recente, o governo voltou a apontar a fortuna incomum de Combs, afirmando que ele não deveria poder “pagar para sair da detenção”.

c. 2024 The New York Times Company

 

 

 

*R7/Foto: Chester Higgins Jr./The New York Times

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