Pelo menos cinco pessoas morreram e outras dez ficaram feridas nesta sexta-feira após serem atingidas por pacotes de ajuda humanitária que foram lançados pelo céu e caíram no campo de refugiados al-Shati, na Cidade de Gaza, norte do enclave. Até o momento, não há informações sobre qual nação seria a responsável pelo envio aéreo, modalidade que tem sido criticada por grupos de ajuda internacional.
As cinco mortes foram confirmadas pelo chefe do Departamento de Atendimento de Emergência do Complexo Médico al-Shifa, Muhammad al-Sheikh. Alguns dos feridos transferidos para a unidade de saúde estão em estado grave, informou o chefe do departamento à CNN e à AFP. Pelo menos dois meninos estavam entre os mortos, segundo a CBS News, e os feridos teriam idades entre 30 e 50 anos.
O acidente teria ocorrido após algumas remessas terem apresentado problemas nos paraquedas, fazendo com que as caixas caíssem sobre as pessoas que aguardavam para recolher a ajuda humanitária. Mohammed al-Ghoul disse à AFP que foi com o irmão acompanhar um dos paraquedas na esperança de conseguir “um pacote de farinha”.
— Então, de repente, o paraquedas não abriu e [o carregamento] caiu como um foguete no chão de uma das casas — disse o homem de 50 anos. — Dez minutos depois, vi pessoas transferindo três mártires e outros feridos que estavam no terraço da casa onde os pacotes de ajuda caíram.
Em vídeos que circulam pelas redes sociais, é possível ver os pacotes caindo velozmente no solo, com os paraquedas inúteis balançando acima. O gabinete de comunicação do governo de Gaza, controlado pelo Hamas desde 2007, disse que os lançamentos aéreos eram “fúteis” e “não eram a melhor maneira de a ajuda entrar”.
Nos últimos dias, vários países lançaram pacotes com ajuda humanitária aérea devido às dificuldades de acesso ao território palestino, sitiado por Israel desde 9 de outubro, dois dias após o início do conflito entre Israel e o Hamas. Entre eles estão os Estados Unidos, que desde sábado enviaram ajuda por via aérea.
O anúncio de que o país entregaria suprimentos pelo ar foi feito pelo presidente Joe Biden há uma semana, um dia depois de autoridades palestinas acusarem Israel de disparar e matar 112 pessoas durante a passagem de um comboio humanitário no território. Israel nega a acusação, afirmando que as mortes decorreram de um tumulto e admitindo apenas disparos pontuais contra um grupo que os soldados consideraram uma ameaça.
Durante o Discurso sobre o Estado da União nesta quinta-feira, Biden anunciou a ordem dada ao Exército americano para construir um porto temporário na região costeira de Gaza. Segundo a Casa Branca, trata-se de uma “missão emergencial”.
O novo porto marítimo, quando concluído, constituirá uma rota adicional para a ajuda humanitária, que está atualmente limitada a duas passagens terrestres para a parte sul de Gaza. Ele deve ter um píer temporário, que “fornecerá a capacidade para o trânsito diário de centenas de caminhões carregados de suprimentos” em coordenação com países da região e organizações humanitárias não governamentais, informou uma autoridade americana.
Medida ineficaz
Grupos de ajuda internacional alertam que o envio de ajuda humanitária aérea e marítima não substitui adequadamente as entregas em Gaza, é ineficaz e desvia a atenção de medidas mais significativas, como pressionar Israel a levantar o cerco a Gaza.
Na quinta-feira, a coordenadora de ajuda da ONU para o território palestino, Sigrid Kaag, disse que “a diversificação das rotas de suprimento por terra” ainda é a solução ideal:
— É mais fácil, mais rápido e mais barato, especialmente se soubermos que precisamos sustentar a assistência humanitária para os habitantes de Gaza por um longo período de tempo — afirmou em uma reunião a portas fechadas do Conselho de Segurança, assegurando que “o ar ou o mar não substituem o que precisamos ver chegar por terra.”
Destaque similar foi feito pelo Comitê Internacional de Resgate, uma organização humanitária com sede em Nova York, em um comunicado no último sábado, no qual afirmou que os lançamentos “não são a solução para aliviar esse sofrimento e desviam o tempo e o esforço de soluções comprovadas para ajudar em grande escala.”
“Os trabalhadores humanitários se queixam sempre de que os lançamentos aéreos são boas oportunidades fotográficas, mas uma péssima forma de entregar ajuda”, afirmou Richard Gowan, diretor das Nações Unidas do International Crisis Group, no X (antigo Twitter), também no sábado.
Lançamentos aéreos geralmente são operados como último recurso por esses grupos, dadas essas desvantagens e os perigos de navegar no espaço aéreo sobre uma zona de conflito e para as pessoas no terreno.
Após quase cinco meses de guerra, a ONU estima que 2,2 milhões de pessoas, a grande maioria da população, estejam ameaçadas pela fome em Gaza, especialmente no norte, onde destruição, combates e saques tornam quase impossível o transporte de ajuda humanitária.
De acordo com a Agência das Nações Unidas para os Refugiados Palestinos (UNRWA, na sigla em inglês), quase 2,3 mil caminhões de ajuda entraram em Gaza em fevereiro, com uma média de 82 veículos por dia — número é 50% menor que em janeiro. (Com AFP)
Fonte: O Globo/Foto: AFP.