As alterações provocadas pelo homem na Amazônia avançam milhares de vezes mais rapidamente do que as causadas por processos naturais, sejam eles geológicos ou climáticos. A conclusão está em um estudo realizado por pesquisadores brasileiros e americanos, publicado nesta quinta-feira, 26, na Science. Os resultados foram considerados tão impressionantes que o trabalho mereceu a capa da prestigiosa revista científica.
Entre os maiores agentes da destruição da Amazônia estão o desmatamento, as queimadas, a erosão do solo, a barragem de rios e a desertificação provocada pelas mudanças climáticas. O estudo demonstra que as mudanças causadas pelo homem afetam o continente em um período de tempo medido em séculos ou décadas. Já os processos naturais levam milhões de anos para provocar algum impacto na América do Sul como um todo.
A pesquisa foi feita a partir de dados sobre o impacto da ação humana na degradação do ecossistema, compilados no ano passado no Painel Científico para a Amazônia.
Comparação
Professor do Queens College, em Nova York (EUA), e especialista no passado geológico da Amazônia, o brasileiro Pedro Val foi quem sugeriu a comparação entre a escala de tempo geológica e a das atividades antrópicas e também quem quantificou a diferença na velocidade de avanço das diferentes ações.
“Para que possamos criar medidas de conservação, não podemos velejar às cegas. É preciso entender a velocidade da degradação do ambiente. Para isso, precisamos saber qual é a velocidade em que os diferentes sistemas naturais operam”, explica Val. “A revisão que publicamos dá o primeiro passo nessa comparação na Amazônia e soa um alarme de que precisamos, imediatamente, interromper o desmatamento e mergulhar fundo na quantificação dos diferentes processos naturais em todas as esferas”, afirma.
O trabalho demonstra que a degradação dos ambientes amazônicos está acontecendo em ritmo sem precedentes, ao qual as diferentes espécies de animais, os povos originários e os ecossistemas não conseguem se adaptar em tempo hábil. Segundo os pesquisadores, as políticas para evitar os piores cenários precisam ser implementadas o mais rapidamente possível.
“O que a gente recomenda e espera que aconteça é que essas informações deem munição para a população e tomadores de decisão do País e do mundo para que possa haver iniciativas e investimentos diretos no combate ao desmatamento”, diz o pesquisador. “No que diz respeito ao futuro, precisamos de políticas que incentivem a bioeconomia sustentável, que valorizem a biodiversidade e o conhecimento dos povos indígenas, além de não encorajar políticas que causam o desmatamento.”
Irreversível
Nascido em Manaus e formado em Geologia pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM), o pesquisador diz que sempre trabalhou para o ecossistema. Ele já foi apoiado pelo Instituto Serrapilheira, por exemplo, numa pesquisa sobre o passado geológico da Amazônia.
“A Amazônia está cada vez mais próxima de um ponto irreversível, em que não terá mais capacidade de recuperar a área perdida, e entrará em processo de savanização”, alerta Val. “Por isso é tão urgente.”
*Estadão conteúdo