Entendimento diferente ‘bagunça’ retirada de flutuantes em Manaus

Publicado em

 A remoção de camada fértil do solo e o assoreamento, isto é, o acúmulo de resíduos no fundo do rio, são algumas das consequências da ocupação irregular de flutuantes na bacia do Tarumã-Açu, na zona oeste de Manaus. O alerta é de Erivaldo Cavalcanti, ambientalista, professor e pesquisador em Direito de Águas da UEA (Universidade do Estado do Amazonas) e Ufam (Universidade Federal do Amazonas).

“Esse problema começou na década de 60, vem se arrastando ao longo dos anos. E se essa situação permanecer, há um grande risco dessa bacia se transformar em um esgoto a céu aberto, como nós observamos na bacia do São Raimundo, na bacia do Igarapé do 40 e no Igarapé do Mindú. Então, isso é muito preocupante”, disse.

Erivaldo propõe a criação de um plano normativo para flutuantes turísticos porque, segundo ele, há “falta de consenso” nas regras de funcionamento dos flutuantes, pois a legislação não esclarece como deve funcionar cada tipo de atividade.

“Isso acontece por quê? Porque a prefeitura vai dizer pra gente que o flutuante, na verdade, é uma plataforma que flutua. O Ipaam (Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas) só vai dar a autorização se ele classificar como restaurante. Outros vão dar o entendimento de que aquilo é um entretenimento e, a rigor, não é um restaurante”, disse o professor.

“Então, fica essa falta de consenso, inclusive, de normas federais porque vai considerar o flutuante uma embarcação. A Prefeitura de Manaus, ora diz que são balneários. Para cada um [tipo de nomenclatura] você teria regras diferentes”, acrescentou.

Autorização para licenciamento

A Lei estadual nº 3.785, de 24 de julho de 2012, autoriza o licenciamento no Amazonas para construção e funcionamento de atividades que utilizam recursos ambientais e são consideradas efetivamente ou potencialmente poluidoras. Entre os estabelecimentos que precisam da LO (Licença de Operação) estão os “restaurantes flutuantes”, ou seja, a legislação assegura a construção das estruturas na bacia do Rio Tarumã-Açu desde que cumpram os critérios ambientais definidos pelo Ipaam.

Além do licenciamento pelo Ipaam, que é obrigatório, os flutuantes também precisam da licença “nada a opor”, da Marinha. O órgão informou, em nota, que a CFAOC (Capitania Fluvial da Amazônia Ocidental) realizou reuniões com a Afluta (Associação dos Flutuantes do tarumã) em 2020 e 2021 para regularizar as estruturas. Além disso, disse que, em 2022, foi emitida a Portaria 53/CFAOC que estabelece a exigência da licença ambiental como requisito para início do processo de regularização. A Marinha, no entanto, não respondeu sobre quantos flutuantes são licenciados pela Autoridade Marítima na área e não informou quais são os critérios para obter a licença.

Linha do tempo

A retirada dos flutuantes irregulares da bacia do Tarumã-Açu é pauta judicial desde 11 de setembro de 2001, quando o MP-AM (Ministério Público do Estado do Amazonas) ajuizou uma ação civil pública contra o município e pessoas ocupantes ou proprietários das estruturas. À época, o órgão pediu que todos os flutuantes existentes no município fossem desmontados, tendo o licenciamento como condição para que fossem reconstruídos. O pedido o MP foi acatado pelo juiz Adalberto Carim Antonio em 26 de novembro de 2004.

Em 2021, a Justiça determinou a retirada de 74 flutuantes da margem esquerda do Rio Negro e do Tarumã-Açu. Em maio de 2022, a juiza Etelvina Lobo Braga determinou que órgãos estaduais e municipais criassem um plano de ação para retirar os flutuantes da área.

“Na época da ação civil pública, quando ela foi ajuizada, eu me lembro bem que se falava em cerca de 40 flutuantes irregulares. Vinte anos depois, nós temos mais de 900 flutuantes. É como se todos os meses fossem construídos nas microbacias desta cidade de Manaus cerca de 10 novos flutuantes”, disse Erivaldo Cavalcanti.

Impasse no licenciamento

Desde o dia 29 de julho deste ano a Prefeitura de Manaus tem notificado e estabelecido prazo de 30 dias aos donos de flutuantes irregulares para que desmontem as estruturas voluntariamente. Segundo Antonio Ademir Stroski, secretário municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade, 500 flutuantes já foram notificados.

Após o prazo, a prefeitura começará a retirar as estruturas cumprindo ordem judicial do dia 7 de junho e outra decisão do dia 14 de julho, que determina a remoção dos flutuantes licenciados e não licenciados do Tarumã-Açu até 31 de dezembro deste ano e exige do Ipaam uma lista com as licenças já concedidas e à Amazonas Energia a inspeção das estruturas irregulares.

O licenciamento ambiental dos flutuantes também está suspenso desde 7 de abril de 2022, quando foi publicada a Resolução nº 07, do CERH (Conselho Estadual de Recursos Hídricos), em que a Sema (Secretaria de Estado de Meio Ambiente) condicionou a liberação das licenças à apresentação do Plano da Bacia Hidrográfica do Rio Tarumã-Açu, que estabelecerá critérios técnicos para a gestão da área.

“O Governo já garantiu o recurso [R$ 1 milhão] para fazer o plano e cabe à secretaria apresentar em um prazo de 24 meses os resultados. Os recursos estão disponíveis e a gente vai fazer a contratação da empresa ou da instituição para fazer os estudos. Provavelmente, vai ser uma chamada pública, tem que ser aberta, o recurso é público. Serão estabelecidos os critérios e as entregas, e vai ser analisada a melhor proposta para a contratação”, disse o secretário estadual de meio ambiente Eduardo Taveira.

O futuro do licenciamento, até segunda ordem, cabe à Câmara Técnica do CERH, que, até o dia 26 de julho, vai revisar a medida que suspendeu o licenciamento para criar uma “brecha” para que os flutuantes sejam regularizados.

Ainda de acordo com Taveira, a solução imediata para os donos de flutuantes seria desmontar as estruturas e voltar a montá-las assim que estiverem regularizadas. No entanto, a partir da decisão judicial da ultima sexta (14), seria necessário esperar uma nova determinação para que pudessem voltar a funcionar.

Moradias

Segundo a legislação do Ipaam, não existe licença ambiental para moradias flutuantes. Para Antonio Ademir, secretário da Semmas, cabe à Justiça analisar a viabilidade de moradias no Rio Tarumã-Açu.

“Imagina que todo mundo que não consegue um terreno, mas pode conseguir fazer um flutuante com todo mundo morando, a gente vai ter uma cidade flutuante. Então o que é fundamental, é ter critério e ordenamento, ser organizado. Se é na orla da cidade de Manaus, qual é a capacidade de suporte? Qual é a questão da segurança da navegação? Da questão de esgotamento sanitário? Do recolhimento de resíduos? Como é que essas pessoas estão sendo abastecidas com água potável? Se elas estão consumindo energia, de onde vem a energia?”, disse.

Em nota, a Semasc (Secretaria Municipal da Mulher, Assistência Social e Cidadania) informou que receberá da Semmas o levantamento de famílias que moram nos flutuantes do Tarumã-Açu, e que, a partir disso, fará a avaliação social dessas famílias para que inseri-las no programa Auxílio Aluguel, que paga, por 12 meses, o valor de R$ 600 por 12 meses. Após esse período, o benefício poderá ser prorrogado por seis meses.

Foto: ATUAL

*Amazonas Atual

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Compartilhe

Assine Grátis!

spot_imgspot_img

Popular

Relacionandos
Artigos

Projeto de Joana Darc quer implementar sistema de multas por maus-tratos aos animais vinculados ao CPF

A deputada estadual Joana Darc (UB), autora do Projeto...

Janeiro: o mês da conscientização sobre a saúde mental

O primeiro mês do ano ganhou destaque nos últimos...