‘Não é mais possível ver o sol’: crise da fumaça muda cor do céu no Pará, sede da próxima COP

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O mês é dezembro e o Pará está em chamas e coberto por fumaça. A fuligem que cobre as cidades é resultado das queimadas, a maioria ligadas ao desmatamento ilegal na Amazônia.

De acordo com os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o estado lidera os focos de queimadas este ano. O cenário expõe os desafios do Brasil para conter a crise a menos de um ano da conferência mundial do clima, que será realizada na capital, Belém.

Segundo o Inpe, o fogo começou no estado em julho e, desde então, permanece acima da média histórica mensal registrada desde 1998. Até agora, foram contabilizados 53 mil focos de incêndio – o maior índice do Brasil em 2024. O Inpe estima que a nuvem de fumaça que vem do estado hoje tenha uma extensão de cerca de 2 milhões de km².

O Pará está em situação de emergência por causa dos incêndios. Enquanto isso, as cidades enfrentam um aumento no número de doenças respiratórias, e, em algumas áreas, o céu já não é mais azul.

O ano de 2024 foi marcado pelo fogo e pela fumaça que sufocaram cidades em todo o país. O auge da crise ocorreu entre agosto e setembro, quando a mancha chegou a cobrir grande parte do território nacional, mas o problema ainda persiste. A fumaça continua se espalhando, embora esteja menos perceptível.

A crise expõe as vulnerabilidades do país no combate ao desmatamento e ao fogo. No último ano, os índices de desmate no bioma vêm caindo, mas estão longe de chegar a zero – meta do governo Lula para 2030.

Pará coberta por fumaça

O fogo ocorre, principalmente, devido ao desmatamento ilegal, no qual o estado também lidera. Os números se refletem em uma mancha de fumaça que tem coberto as cidades na região.

Em Santarém, a prefeitura decretou estado de emergência devido à baixa qualidade do ar. O governo local anunciou que está adotando medidas para conter os incêndios, mas a cidade possui mais de 22 mil km² de extensão – quase 15 vezes o tamanho da cidade de São Paulo em área –, e não há efetivo suficiente.

A fuligem que cobre a cidade não é só de incêndios locais, mas de fogo de outras áreas, mas que a nuvem cinza vem arrastada pelo vento. Um dos pontos levantados pelos gestores locais é o tamanho das áreas e a dificuldade para combater as chamas.

O Pará é um dos maiores estados do país, com uma grande área de floresta. Em setembro a Força Nacional foi mobilizada para apoiar o combate às chamas em seis estados, incluindo o Pará, mas o reforço não se manteve.

Na última semana, a prefeitura solicitou reforço ao governo federal com equipes da Força Nacional para combater as chamas. O g1 acionou o governo federal questionando se o pedido vai ser atendido.

Em nota, o Ministério do Meio Ambiente afirmou que, em 2024, o “governo federal mobilizou mais de 1.700 profissionais, disponibilizou 11 aeronaves, mais de 20 embarcações e mais de 300 viaturas, além de combater 578 incêndios de grandes proporções”. No entanto, não disse quando isso ocorreu e se agora vai acatar o pedido.

Ainda segundo o ministério, com a retomada da fiscalização ambiental, houve queda de 30,63% no ritmo de desmatamento na Amazônia de agosto de 2023 a julho de 2024.

Nos hospitais do estado, os casos de doenças respiratórias continuam a aumentar, afetando principalmente idosos e crianças, que apresentam sintomas como tosse, vômito e diarreia. Segundo a Secretaria de Saúde de Santarém, o atendimento por doenças respiratórias cresceu 42,56% em relação ao mesmo período do ano passado.

O médico Luiz Fernando Rocha, que atende na rede pública do Pará, relata que, há alguns dias, não se consegue ver a poucos metros de distância devido à fumaça e que a demanda nas unidades de saúde está aumentando, evidenciando a gravidade da crise de saúde pública.

É uma infestação de fumaça; o céu está invisível. Em alguns lugares, por exemplo, não é possível ver o sol, e o cheiro de fumaça e fuligem é constante. As pessoas estão adoecendo, convivendo com essa fumaça sem medidas eficazes para resolver o problema
— Luiz Fernando Rocha, médico da rede pública no Pará.

Karla Longo, pesquisadora do Inpe que analisa a poluição e a fuligem na atmosfera, a fumaça diminuiu em outubro, acompanhando uma redução em outras partes do país. Contudo, com a constante do fogo, voltou a subir em novembro, superando a média para o período.

Ao mesmo tempo que o fogo continuou, a estiagem não deu trégua na região. O país enfrenta a maior seca da história, com mais impactos no Norte, e, com isso, o período de chuvas atrasou, prolongando os incêndios.

As queimadas naquela região não são eventos naturais; são, na maioria, criminosas. A expansão da pecuária e da agricultura tem aumentado o desmatamento e o uso do fogo ano após ano. Não dá para esperar que a chuva venha e resolva esse problema. É preciso uma ação urgente dos governos para conter essa dinâmica.
— Karla Longo, pesquisadora do Inpe que analisa a poluição e a fuligem na atmosfera.

No entanto, além desses estados, a plataforma do Inpe mostra que a fuligem continua se espalhando pelo país, alcançando estados das regiões Sul e Sudeste, como São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Contudo, chega a essas regiões de forma menos densa e menos perceptível.

“As pessoas precisam saber que a fumaça não deixou de existir e não dá para cobrar só quando se consegue sentir. É hora de discutirmos como acabar com isso”, diz Karla Longo.

Nota do Ministério do Meio Ambiente

Os incêndios florestais no Brasil são intensificados pelas mudanças climáticas, que causa a maior estiagem no país em 75 anos. Em 2024, desde o início das ações de combate aos incêndios na Amazônia, o governo federal mobilizou mais de 1.700 profissionais, disponibilizou 11 aeronaves, mais de 20 embarcações e mais de 300 viaturas, além de combater 578 incêndios de grandes proporções. É importante ressaltar que a resposta foi iniciada em 1º de janeiro de 2023, com a criação da Comissão Interministerial Permanente de Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas. Atualmente, 500 profissionais atuam no combate aos incêndios no Pará e no Maranhão.

O Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm) foi relançado em 5 de junho de 2023. Com a retomada da fiscalização ambiental, houve queda de 30,63% no ritmo de desmatamento na Amazônia de agosto de 2023 a julho de 2024, segundo estimativa do sistema Prodes, do Inpe. É a maior queda percentual em 15 anos.

Em junho, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou um pacto com governadores para combater o desmatamento e os incêndios no Pantanal e na Amazônia. Em julho, foi sancionado o Projeto de Lei n° 1.818/2022, que institui a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo. O Comitê Nacional de Manejo Integrado do Fogo, previsto pela política, foi instalado pelo governo federal em 9 de outubro e já realizou duas reuniões.

O presidente Lula publicou também Medida Provisória que autorizou R$ 137 milhões para o combate aos incêndios no Pantanal, incluindo R$ 72,3 milhões para o Ministério do Meio Ambiente (MMA). Em setembro, foi assinada outra MP que autoriza crédito de R$ 514 milhões para o combate aos incêndios na Amazônia, incluindo R$ 114 milhões para o MMA. Uma terceira MP, assinada em novembro, flexibiliza a transferência de recursos do Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA) para estados e municípios em regiões com emergência ambiental, priorizando agilidade no combate aos incêndios.

Fonte: G1/Foto: Luiz Fernando Rocha

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