“Quem esse general pensa que é?! Um “semideus”? Agora o mundo inteiro sabe dessa loucura! Estou a um “passo” para ser promovido! Será que ele não pensa em quantos está prejudicando?” – o general da Divisão de Santa Maria não contém mais a sua raiva. Os oficiais do seu Estado-Maior e comandantes das Unidades locadas em Santa Maria, sentados à mesa de reunião, observam o estado desesperado do general da Divisão. Mais um mês e ele poderá ser promovido a General-de-Exército. Está muito “cotado” para a promoção, dizem os amigos de Brasília. Está ou estava?. “Você – apontando o dedo indicador para o coronel – pegue o seu Grupo de Artilharia de Campanha Autopropulsado com aqueles canhões 155 mm e vá direto para interceptar a Brigada Blindada. Você e você! – aponta para o comandante do Batalhão de Infantaria Blindado. Os dois! Quero que coloquem a Brigada desse “generalzinho de m…” numa situação tal, que só lhe reste a rendição!”. Ele aponta para o seu Chefe de Estado-Maior e diz: “Quero que a tropa percorra esses 140 Km até Rosário no menor tempo possível. Com a ponte sobre o rio Santa Maria destruída e os dois Regimentos de Carros de Combate na retaguarda deles, nós os “esganaremos” até a rendição total. É guerra que ele quer, então terá!”. Ainda fala ao seu auxiliar: “Liga para a Aeronáutica e peça apoio de fogo com os caças F-39 “Gripen”, e que fiquem prontos para sair ao meu comando”. Em Rosário do Sul, a multidão chega até a frente do Comboio. As bandeiras do Brasil tremulam nas mãos do povo. A “cavalaria de gaúchos e gaúchas montados” começa a se mover para seguir em frente e a multidão se afasta para o lado do acostamento da rodovia. Em pouco tempo se abre uma “fenda” naquele “mar de gente”. O General dá ordem para seguir. Aos poucos, o grande Comboio se desloca, com os caminhoneiros, com os cavaleiros e amazonas, com a Brigada propriamente dita e mais a população. Inimaginável! Os dois comandantes dos Regimentos de Carros de Combate dão ordem para não atirar e, também, ceder passagem ao grande Comboio que se aproxima. Por quase três horas, ao canto incessante do Hino Nacional, o Comboio passa por Rosário e segue destino a São Gabriel. As últimas viaturas deixam Rosário sob aplausos da população entusiasmada. Já está quase para anoitecer. Por rádio, o General manda que o Batalhão Logístico ultrapasse a tropa com o seu material, pessoal e viaturas necessárias para acampar antes da ponte do rio Santa Maria. Ali, há uma extensa área descampada que possibilita retirar toda a Brigada da Rodovia. Com isso, libera o fluxo de trânsito da estrada por uma noite. Também, preparariam o jantar com comida quente para toda a tropa. Até agora, todos se alimentaram com “ração operacional”. No dia seguinte teriam mais 60 Km até São Gabriel. Um tempo depois, o CHEM se comunica, por rádio, com o General: “General, os dois Regimentos de Carros de Combate que estavam em Rosário, através dos seus dois comandantes, pedem autorização para se juntar ao nosso Comboio”. O General fica em silêncio por uns instantes. Depois: “Sim, está autorizado. Diga para os coronéis comandantes falaram comigo logo que fizermos o “alto” para acampar”. Ele conhecia bem os dois coronéis, seus ex-alunos da ECEME. De Santa Maria, um comboio militar fortemente armado partiu há 4 horas, em máxima velocidade, para a região de Rosário. São 120 Km de distância pela rodovia RS- 640 e chegariam à frente do Comboio, logo após a ponte sobre o rio Santa Maria, no sentido São Gabriel. Passado algum tempo, o comandante do Batalhão Logístico se comunica, via rádio, com o General: “Comandante, antes da área que o senhor determinou para o acampamento, num trecho ao lado da rodovia, há mais de cinquenta churrasqueiras “de chão”, com os gaúchos assando carne para a nossa Brigada. Vou até a área montar o acampamento, mas peço permissão para não fazer o jantar”. “Você tem certeza do que está falando? – pergunta o General, meio assustado. “Sim, General. Daqui a pouco o senhor verá com os próprios olhos”. Bem que o General reparou que, logo que saíram de Rosário, os cavaleiros e amazonas se desconectaram do Comboio e saíram pela pradaria à galope . Nem Denise veio se despedir. Poucos quilômetros depois, com a noite já “caindo” sobre os pampas, o General percebeu uma coluna de fumaça ao longo do acostamento da rodovia. Eram muitas churrasqueiras, separadas um das outras em torno de 30 metros. Logo, o cheiro de carne assada passeava entre as viaturas e o pessoal colocava a cabeça de fora. Gritos de alegria! O General sorri, emocionado. “Deus! ó Deus! onde estás que não respondes?!” (Vozes D´África – Castro Alves). Tantas vezes fez essa mesma pergunta em suas orações antes de decidir sobre essa jornada até Porto Alegre. Agora já tem a resposta: o dia todo e todos os dias Deus lhe “respondeu”. Passando pela primeira churrasqueira, ele nota um gaúcho “pilchado” com uma faca na mão. Ele manda o “Leopard” parar. Olha para o gaúcho e sorri. “Bah, tchê “generar”! Apeia desse “cavalo de aço” e “churrasqueia” com a gente. Tem um “matambre” no ponto para “beliscar!”. Era o Domingos José de Almeida. Ele e outros Estancieiros abateram quase cinquenta reses, entre gado e ovelhas, e organizaram o “churrasco”. Comida suficiente para toda a tropa e os caminhoneiros, além do pessoal dos dois Regimentos recém anexados. Alguns quilômetros à frente, do outro lado da margem do rio Santa Maria, um grupo de militares do Batalhão de Engenharia de Combate Blindada, de São Gabriel, aguarda ordens para detonar os explosivos que destruirão o vão central da ponte sobre o rio Santa Maria, para impedir a passagem pela BR-290. No local, na escuridão da noite sem Lua, quatro militares “Forças Especiais”, comandados pelo coronel Bento, comandante de um dos Regimentos de Rosário do Sul e que se incorporou ao Comboio do General, se esgueiram pelos arbustos ribeirinhos. Eles têm que localizar os “fios elétricos” do “explosor” que detonará a ponte.
Por: Elias do Brasil / escritor e historiador, membro do Instituto de Geografia e História Militar do Brasil (IGHMB) e articulista.