Seca no AM revela forte do século XVIII que marcou fronteira com terra espanhola

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A seca histórica do rio Solimões fez reaparecer as ruínas do Forte São Francisco Xavier, no município de Tabatinga (AM). A localização foi informada pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), que visitou o local no dia 25 de outubro, fez registro de acervo inédito e decidiu incluir o local no Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos, que reúne dados desse patrimônio no Brasil.

A edificação foi erguida em 1766 ainda pela Coroa Portuguesa na região da tríplice fronteira entre Brasil, Colômbia e Peru. Segundo o Iphan, a edificação no ponto extremo do rio Solimões brasileiro é considerada um “marco da consolidação da fronteira brasileira na região Norte.”

Vestígios arqueológicos, como louças, vidro, material construtivo e ferroso, foram achados no local.

“Esse conjunto de vestígios nos possibilita conhecer a ocupação do local e a estrutura de edificações.
Jaime Oliveira”, arqueólogo do Iphan.

Ocupação e proteção


Segundo estudo dos pesquisadores Ricardo José Batista Nogueira, Thiago Oliveira Neto e Fellipe Costa Barbosa, os primeiros registros sobre a ocupação dessa região são do século 16, com a expedição de Francisco Orellana. Em nome do império espanhol, ele saiu da cidade de Quito, no Equador, em 1542, e percorreu a maior parte do que hoje chamamos de rios Maranon, Solimões e Amazonas.

Ainda segundo os pesquisadores, esses exploradores chegaram ao oceano Atlântico e fizeram crônicas descrevendo os inúmeros povos, ambientes e territórios desbravados.

Apenas um século depois é que uma expedição brasileira, de Pedro Teixeira, partiu da cidade de Belém, fazendo o primeiro percurso inverso e deixando isso registrado.

Foto: arte/uol

Segundo os registros históricos do Exército, o forte tinha a função de posto militar, mas era usado especialmente para coibir o contrabando de mercadorias. Inicialmente, ele foi destinado a inspecionar canoas que se dirigiam à povoação espanhola de San Pablo de Loreto, no Peru.

O Exército explica que o local ficava ao lado de uma aldeia construída por jesuítas, provavelmente em 1710. O forte teria servido como demarcação da fronteira noroeste do Brasil, “assim defendendo de ataques espanhóis aquela região.”

Quem determinou a construção do local foi o governador do Estado do Grão-Pará e Maranhão, Fernão da Costa de Ataíde Teive Souza Coutinho. Ele tinha um hexágono irregular, com madeira grossa e sete palmos de projeção vertical.

“A fortificação de Tabatinga, mesmo precária, teve o seu papel de importância, tendo em vista reclamações espanholas sobre aquele espaço territorial”.


Graciete Guerra da Costa, na publicação Fortes Portugueses na Amazônia Brasileira.

Foto: reprodução/exército

Não era para guerra
Um detalhe que Jaime Oliveira ressalta é que a edificação, assim como outras no Amazonas, não tinha estrutura imponente, ou seja, não foi feita como estratégia de defender o país em uma eventual situação de guerra.

“Essas construções do século 18 tinham mais a meta de contribuir com a consolidação do território e da fronteira atual. Elas eram feitas inicialmente de palhas de madeira, e só posteriormente foram criando estrutura de alvenaria”.
Jaime Oliveira, arqueólogo do Iphan

Jaime explica que o rio Solimões sofreu, como outros rios da Amazônia, um processo de mudança de curso ao longo dos anos. Por isso, o material achado agora pelo Iphan possui grande relevância arqueológica.

“Isso cria o fenômeno das terras caídas, que são situações em que o rio sofre desbarrancamento nas suas laterais, fazendo com que antigos locais de ocupação, sejam pré ou pós-coloniais, se tornem áreas alagáveis do rio. Por isso o forte e outros sítios ficam parcialmente cobertos por água”.
Jaime Oliveira

O forte guardava nove peças de artilharia, das quais restam cinco: duas estão expostas no Museu Histórico Nacional do Rio de Janeiro e três, no Quartel do Comando de Fronteira do Solimões, do Exército Brasileiro. Na última semana, técnicos do Iphan vistoriaram as ruínas do forte.

Foto: Jaime Oliveira/Iphan

Forte desabou


O forte existiu até 1889, quando foi desocupado. Em 1910, ele foi reocupado por tropas do Exército, que ficaram ali por 22 anos até que enchentes no rio Solimões derrubaram o local em 1932.

Em 1949, o local passou a abrigar uma nova edificação do 5º Pelotão de Fronteira. Vinte anos depois, virou o Comando de Fronteira Solimões.

A partir de 1992, ele passou a ter a atual denominação (Comando de Fronteira Solimões/8º Batalhão de Infantaria de Selva), hoje subordinado à 16ª Brigada de Infantaria de Selva, sediada em Tefé. O local também é conhecido como Batalhão Forte São Francisco.

Foto: Jaime Oliveira/Iphan

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