Nos últimos seis meses, o foco das notícias que saem do Irã é concentrado nas mulheres, que se rebelaram contra o código de vestimenta islâmico e têm sido vítimas de uma misteriosa onda de envenenamento em escolas femininas.
Ambas as situações se interligam no período de maior descontentamento com o regime dos aiatolás desde a Revolução Islâmica, em 1979.
Mais de mil estudantes foram atendidas nos últimos dias com sintomas de enjoos, tontura e palpitações em 50 escolas espalhadas por dez províncias do país. Elas teriam sido envenenadas por emissões de gases tóxicos.
Os ataques disseminaram teorias como a de vingança de extremistas islâmicos, que querem acabar com as escolas femininas, ou a do clássico argumento do regime, que aponta o dedo para os seus inimigos externos.
As suspeitas de envenenamento levaram o líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, a defender a pena de morte e sem anistia para seus responsáveis. “Trata-se de um crime imperdoável”, disse.
Entidades de direitos humanos, no entanto, veem a cumplicidade do governo nos ataques que têm como alvos as estudantes de ensino médio e universitário, que fortaleceram os protestos contra o regime.
O diretor executivo da ONG Centro de Direitos Humanos do Irã, Hadi Ghaemi, classificou o suposto envenenamento de meninas em idade escolar como atos terroristas, que, no seu entender, evidenciaram a estreita relação entre o governo e grupos que têm capacidade para executar os ataques.
“Eles expõem a mentalidade fanática, sem lei e violenta que está ressurgindo sob este governo irresponsável e tentando forçar o país inteiro, especialmente as mulheres, a retroceder.”
Em contrapartida à autoridade máxima do país, que defendeu punições para quem envenena estudantes, o chefe do Judiciário, Gholamhossein Mohseni Ejei, decretou, nesta segunda-feira (6), severas sanções para quem violar o código de vestimenta imposto sobre as iranianas. Ele vem fortalecendo o cerco aos manifestantes que desafiam o regime. Em dezembro passado, emitiu decreto exigindo um processo rápido para os presos nos protestos.
Mais de 500 pessoas foram mortas em confrontos com forças de segurança, que prenderam 20 mil manifestantes. A Agência de Notícias de Ativistas de Direitos Humanos calcula que 110 presos enfrentam acusações que podem levar à pena de morte.
Sob a lei islâmica, as iranianas são obrigadas a cobrir o cabelo e a usar roupas largas.
Em setembro, a jovem Mahsa Amini foi morta, após ser presa pela polícia da moralidade, por supostamente desrespeitar o código de vestimenta, desencadeando protestos contra o governo teocrático em todo o país. A contar pela recente onda de envenenamentos de meninas e a consolidação definitiva do código de vestimenta, o regime detém o pulso forte contra os descontentes.
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