“Na madrugada de quarta-feira, dia 04/08/1954, o jornalista e político Carlos Lacerda, maior opositor do presidente Getúlio Vargas e que fazia ferrenha campanha contra Getúlio no jornal Tribuna da Imprensa, de sua propriedade, foi atingido por um tiro no pé quando chegava ao número 180 da rua Tonelero, em Copacabana (Rio), onde morava. Os disparos, vindos de um carro, atingiram também o major da Aeronáutica Rubem Vaz, que fazia a segurança de Lacerda com outro oficial. Vaz foi morto com dois tiros. De acordo com o inquérito policial, o mandante do crime foi Gregório Fortunato, chefe da Guarda Pessoal de Vargas”. (jornal Folha de São Paulo, de 11/07/2022). Essa semana, no saguão de um aeroporto, um local público, o deputado federal general Girão (PL/RN) cruzou com o atual ministro da Justiça e o deputado, num tom de desgosto, segundo ele, balançou a cabeça negativamente. O ministro da Justiça avançou na direção do deputado e lhe tocou o peito com a mão, dizendo: “Se cuide!”. Talvez, as câmeras do saguão do aeroporto tenham as imagens desse imbróglio. Porém, o deputado, por sua posição no Congresso, tem voto de fé no que diz. O Ministro da Justiça estava acompanhado da sua segurança pessoal da Polícia Federal e por ela protegido. Quando um agente público, cotado para uma indicação de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) pelo atual governo, ameaça em público, acompanhado por seus seguranças, um deputado federal a ponto de lhe dizer “Se cuide!”, há uma quebra, uma ruptura de qualquer diálogo. É o tal do “partir para a ignorância”. Agora, nesse nível elevado da política, se pode indagar que tipo de cuidado o deputado general Girão deverá ter. É fato que uma ameaça dessa natureza, se concretizada, pode derramar sangue, como no caso do Carlos Lacerda, acima descrito. Duas autoridades de alto nível, tanto do Executivo como do Legislativo, se confrontam como dois “cangaceiros” e, da mesma forma que antigamente, pode ocorrer que ajam como “Lampião”, que não deixava para ontem o que poderia fazer hoje. O que esperar daqueles do povo que souberam do ocorrido? E se as ofensas tomarem as ruas? Exemplo é exemplo, principalmente quando vem de cima. Hoje, 20/09/2023, é comemorado o dia da “Revolta Farroupilha” ou “Guerra dos Farrapos”. Naquela época, o Rio Grande do Sul era quase que economicamente independente do restante do Brasil, principalmente na produção do charque, e havia uma disputa política entre os Liberais. Um lado desejava maior autonomia entre as províncias e o outro lado defendia a unicidade do poder central, de acordo com a Constituição de 1824. O resultado foi uma guerra que se estendeu de 20 de setembro de 1835 a 1 de março de 1845, inclusive com a declaração da independência do Rio Grande do Sul e constituindo a Proclamação da “República Rio-Grandense”. Muito sangue já se derramou pelo Brasil, poucos se lembram e muitos jamais se interessaram em saber. Uma grave discussão entre “altas autoridades governamentais” é tão inconsequente como “riscar” um fósforo num palheiro.
Por: Elias do Brasil / escritor e historiador, membro do Instituto de Geografia e História Militar do Brasil (IGHMB) e articulista.
