O ex-diretor da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) e atual deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) presta depoimento neta quarta-feira (17), na Superintendência Regional da Polícia Federal no Rio de Janeiro. A oitiva acontece pelas investigações de um suposto esquema de espionagem ilegal contra autoridades, enquanto ele estava à frente da Agência (relembre caso abaixo). Os investigadores querem esclarecer se existe envolvimento do atual comando da Abin com os possíveis operadores do esquema, principalmente os antigos integrantes da agência que produziam relatórios contra os supostos alvos do monitoramento ilegal.
O depoimento acontece após a queda de sigilo de um áudio gravado por Ramagem de uma reunião em 2020 com o ex-presidente Jair Bolsonaro, o ex-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional) Augusto Heleno e duas advogadas do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).
Os registros mostram uma discussão sobre como “blindar” o filho de Bolsonaro da investigação sobre suposto esquema de rachadinha enquanto ele era deputado estadual na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro).
Além disso, Ramagem deve ser questionado sobre novas informações sobre o caso divulgadas após operação da PF que prendeu preventivamente cinco pessoas que teriam participado do esquema, na última quinta-feira (12).
No relatório enviado ao STF, que autorizou as medidas judiciais, a PF informou que os policiais federais que atuavam na Abin, sob a direção de Ramagem, utilizaram-se das ferramentas da agência para serviços “ilícitos e para interferir em diversas investigações da Polícia Federal”, como, por exemplo, a envolvendo Renan Bolsonaro, filho do ex-presidente.
“As ações de ‘inteligência’ realizadas não deveriam deixar rastros, razão pela qual a então alta gestão decidiu que não haveria difusão do relatório, ao tempo da diligência solicitada pelo GSI diretamente para a Direção-Geral da Abin. Noutros termos, o presente evento corrobora a instrumentalização da Abin para proveito pessoal. Neste caso, o intento era fazer prova em benefício ao investigado Renan Bolsonaro”, diz a PF.
Outro lado
Nas redes sociais, Ramagem afirmou que não há interferência ou influência em processo vinculado ao senador Flávio Bolsonaro com a agência.
“Não há interferência ou influência em processo vinculado ao senador Flávio Bolsonaro. A demanda se resolveu exclusivamente em instância judicial. A PGR não foi favorável às prisões da operação, mas a Justiça desconsiderou a manifestação. Há menção de áudio que só reforça defesa do devido processo, apuração administrativa, providência prevista em lei para qualquer caso de desvio de conduta funcional. Houve finalmente indicação de que serei ouvido na PF, a fim de buscar instrução devida e desconstrução de toda e qualquer narrativa. No Brasil, nunca será fácil uma pré-campanha da nossa oposição. Continuamos no objetivo de legitimamente mudar para melhor a cidade do Rio de Janeiro”, disse.
Como funcionava a espionagem
O uso irregular de um sistema da Abin para monitorar autoridades brasileiras, jornalistas e advogados começou a ser investigado em 2023. Segundo a apuração, o programa First Mile permitia o monitoramento de milhares de pessoas — e teriam sido feitos 60 mil acessos a ele em dois anos e meio. O software consegue monitorar cerca de 10 mil celulares por até 12 meses.
Segundo a PF, para acionar o sistema de geolocalização e ter acesso às informações das pessoas, bastava digitar o número do celular. A aplicação também criava históricos de deslocamento e alertas em tempo real da movimentação dos aparelhos cadastrados.
Entre os monitorados ilegalmente, estariam os ministros do STF Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Luis Roberto Barroso e Luiz Fux e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
Além deles, a corporação diz que as seguintes personalidades políticas foram espionadas:
- Rodrigo Maia, ex-presidente da Câmara
- Kim Kataguiri, deputado federal
- Joice Hasselmann, ex-deputada federal
- Alessandro Vieira, senador
- Omar Aziz, senador
- Renan Calheiros, senador
- Randolfe Rodrigues, senador
- João Doria, ex-governador de São Paulo
Em relatório enviado ao STF, a Polícia Federal informou que o programa First Mile foi adquirido por aproximadamente R$ 5 milhões e não poderia ser considerado como mero “brinquedo de criança” e nem ser utilizada para monitorar pessoas sem qualquer pertinência com as atribuições institucionais da Abin.
*R7/Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados