O dólar emendou nesta quinta-feira (29) o segundo pregão consecutivo de queda firme, acompanhando o movimento global de enfraquecimento da moeda americana, em dia marcado por apetite ao risco. Analistas afirmam que a aposta em alta mais pronunciada da taxa Selic e a perspectiva de manutenção de liquidez global farta nos próximos meses – propiciada pelo tom ameno do Federal Reserve ontem e reforçada, hoje, pelo resultado aquém do esperado do PIB dos EUA no segundo trimestre – abrem uma janela para apreciação do real no curto prazo.
A taxa Selic mais gorda aumenta a atratividade da renda fixa brasileira e pode estimular os exportadores a internalizar mais recursos. Também conta a favor do real nas próximas semanas a possibilidade de elevação do fluxo externo de recursos para ofertas de ações na B3, que, até o momento, tem sido em sua maior parte absorvida por investidores locais. Com esse pano de fundo, já há quem veja a possibilidade de o dólar furar o piso de R$ 5, caso não haja solavancos do lado político.
Hoje, o dólar rompeu R$ 5,10 já na abertura e, no início da tarde, chegou a furar o piso de R$ 5,05, ao descer até a mínima de R$ 5,0422. No fim da sessão, a moeda americana era negociada a R$ 5,0792, em queda de 0,60%, levando a desvalorização na semana a 2,52%. É o menor valor de fechamento desde 2 de julho. Apesar do tombo recente, o dólar ainda acumula alta de 2,13% em julho. Amanhã, é dia de formação da última Ptax do mês, o que pode exacerbar a volatilidade da moeda.
A economista-chefe da Armor Capital, Andrea Damico, vê uma janela favorável para o real no curto prazo, na esteira de entrada de dinheiro para aproveitar o diferencial de juros – com eventual alta de 1 ponto porcentual da Selic em agosto e sinalização de outra elevação de 1 ponto na sequência – e manutenção de um ritmo forte de exportações. “No quesito crescimento, apesar de cerca moderação na margem, o Brasil está em vantagem em relação a outros países, o que também favorece a moeda”, afirma.
Outro ponto que deve ser observado é a dinâmica do câmbio contratado. A economista destaca que no segundo trimestre os exportadores deixaram cerca de US$ 7 bilhões no exterior, mesmo com a Selic já mais elevada. “Não é possível saber se o exportador vai alterar sensivelmente sua forma de atuar. Mas faz sentido trazer um pouco mais de recursos se a Selic subir 100 pontos-base (1 ponto porcentual)”, pondera.
Para o economista-chefe Instituto Internacional de Finanças (IFF), Robin Brooks, os mercados sabem que a redução de estímulos nos Estados Unidos não virá em breve, o que dá impulso às moedas emergentes, “especialmente onde os bancos centrais estão subindo os juros, caso do Brasil”. Brooks ainda vê o real 15% abaixo de seu valor justo, de R$ 4,50. “Os estrangeiros estão entusiasmados. O que é necessário para que os brasileiros fiquem um pouco menos negativos com seu próprio País…”, escreve Brooks no Twitter.
Damico, da Armor, vê espaço para que o dólar fure o piso de R$ 5 no curto prazo, mas não acredita em taxa de câmbio na casa de R$ 4,60 ou R$ 4,50. No médio prazo, observa a economista, a tendência é de a moeda americana subir e encerrar o ano em R$ 5,30. Ela argumenta que ao aumento de remessas de lucros e dividendos, evento típico de fim de ano, vão se somar uma balança comercial menos exuberante e a liquidação da segunda parte do overhedge dos bancos. E isso vai acontecer justamente no momento em que o debate sobre o ‘tapering’ estará a pleno valor, o que pode dar fôlego à divisa dos EUA.
“As pessoas também vão começar a olhar mais para os riscos eleitorais. Isso tudo torna o fim de ano um pouco mais difícil para a moeda”, afirma a economista da Armor, lembrando também que ainda existem dúvidas também em torno do impacto da reforma tributária sobre as remessas de lucros e dividendos.
*Estadão Conteúdos